Livro resgata alimentos e receitas de comunidades rurais sergipanas 36c6f
Publicado em 03 de abril de 2020 Por Jornal Do Dia 556l6r
"Comida enquanto manifestação da cultura compõe nossa identidade e nos singulariza. É ela que ocupa lugar nas lembranças dos mais velhos e pode ser reada como objeto cultural aos mais jovens", afirma a pesquisadora Paloma Naziazeno, que lança o livro a Sergipana: sabores da terra de araras e cajus no dia 21 de abril, às 17h, no projeto virtual Quanto mais a prosa invade, mais a poesia resiste – um bate-papo realizado pelo curso de Jornalismo Gastronômico, de Juliana Dias e Juliana Venturelli. A conversa será realizada por meio da plataforma Zoom, podendo participar 100 pessoas. Para se inscrever, basta enviar um e-mail para: [email protected].
Foram dois anos de pesquisas e mais de dois mil quilômetros entre idas e vindas por todo estado de Sergipe para que a Sergipana ficasse pronto. O livro, contemplado pelo Rumos Itaú Cultural 2017-2018, foge dos modelos já conhecidos de receitas e resgata alimentos esquecidos, memórias e valoriza a história da gastronomia sergipana como patrimônio imaterial. O volume também conta com o trabalho da fotógrafa documental Melissa Lee Warwick, produzindo material fotográfico acerca dos alimentos e das pessoas que os cultivam, e da chefe de cozinha Seichele Barboza, que ressignifica os ingredientes, assinando 14 receitas, trazendo-os para a linguagem gastronômica contemporânea.
"Sergipe é, em sua origem, patriarcal e ruralista, o menor estado da federação, mas com muita identidade", fala Paloma. Desta forma, a Sergipana preenche uma lacuna no que tange à publicação de obras voltadas para a peculiaridade da culinária alternativa de comunidades rurais sergipanas. Dá voz aos excluídos da história, mas que mantém tradições seculares no manuseio e preparação de receitas não mais presentes no cotidiano alimentar de núcleos urbanos mais desenvolvidos.
Foram 12 municípios percorridos dentro de outro Sergipe, mais profundo, agora visto pela comida. Paloma escolheu entrar no mato e nas cozinhas, sentar-se ao lado das pessoas que habitam o sertão sergipano. Várias abriram suas casas, contaram sobre suas vidas, mostraram suas terras e preciosidades que brotavam nelas.
"Ouvi um a um, com calma e sentidos aguçados, fui levada a me conhecer através deles", conta a autora. "Lembrei de vó, das tias velhinhas, do tempo de mãe que contava sobre uma outra Aracaju. A comida nos identifica", diz.
"O sociólogo Maurice Halbwachs disse que a memória além de individual, é um fenômeno social e/ou coletivo. Pude resgatar memórias que demarcam uma identidade, um tempo, um gesto, cheiros", continua Paloma. "Quando resgatamos histórias sobre comida nunca é somente a comida, vem a memória afetiva e tudo o que nos torna daquele lugar, o que diferencia o eu do outro."
As cidades foram escolhidas justamente por causa dos alimentos pesquisados e, mesmo assim, alguns lugares originais que estavam no projeto foram cortados do resultado, pois os alimentos estudados não existiam mais. No livro, entraram 15: Maxixão, Major Gomes, Caboge, Pirambeba, Saburica, Café de Quiabo, Cacto Cabeça de Frade, Cambucí, Umbucajá, Maracujá de Trovoada, Coalhada de pepino, Cuminho, Bufú, Maniçoba, Cachaça de Capela – a tradicional cachaçaria artesanal sergipana, entra no livro, mostrando as formas de cultivá-la e maneiras de pô-la à mesa.